terça-feira, janeiro 27

"O teu olhar ficara no meu olhar quando morrer e, morto, contemplar as planicies que serao o teu olhar a anoitecer lento. O teu olhar ficara nas minhas maos esquecidas e ninguem se lembrara de o procurar ai. Penso: nunca ninguem se lembra de procurar as coisas onde elas estao, porque nunca ninguem sabe o que pensa o fumo, ou as nuvens, ou um olhar. E tu. Continuaras perdendo o silencio por maos esquecidas, ira a enterrar o teu silencio no meu peito (...) E' o meu olhar e o teu silencio (...) Avanço sozinho e tenho-vos todos aqui. Levar-vos-ei sempre comigo. Olho de frente o ultimo raio de sol antes de o sol desaparecer. Penso: um homem e' um dia, um homem e' o sol durante um dia(...)
E essa angustia sera maior porque nunca mais poderei ver-te, nunca mais poderei ouvir o teu silencio e toda a esperança que um dia tive sera nula. Morto, assistirei ao negro aboluto que nenhum homem pode suportar em vida. Nenhuma luz, nenhuma luz (...)
Enfiou a argola da corda pela cabeça e apertou-a no pescoço. Nao olhou o mundo por uma ultima vez. Deu um salto breve em frente. O pescoço estalou num ruido de ossos a separarem-se.Baloiçou por momentos, ate ser aprumado e imovel (...) Um pardal olhou-o e viu-lhe os olhos vazios de esperança, as maos vazias, e levantou-se no ceu a voar. Jose diminuiu, diminuiu, e, quando o pardal o olhou la de cima, Jose era apenas uma pernada caida de uma azinheira torta de encontro ao horizonte vermelho de sangue."


by Jose Luis Peixoto
in Nenhum Olhar

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