quinta-feira, junho 30

Tanto como apenas o nada

"O que oferecer a alguém que já tem tudo muito melhor do que sou capaz de lhe conseguir dar?
Bem... e se esse alguem já for mais especial do que aquilo que eu lhe poderei dar que considere especial?
E se essa pessoa tiver uma aura maior do que a minha? Maior do que a sua? E se essa pessoa for maior do que a vida?
Talvez daquelas pessoas por quem o nosso coraçao bate mas a nossa consciencia, adquirida por entre processos de socializaçao estranha e perturbadora que nos acompanha no crescimento e nos molda, nao nos deixa fazer nada concordante.
E se for alguém ? qual nao consigo negar nada e consigo pedir tudo? Se for alguem com quem seja demasiado facil de se falar?
Se for alguem cujo brilho é mais luminoso que o palido e mais escuro que o breu? E se for alguem que nao conheço assim tao bem? Se for um misterio? Se nao souber o que faz nem onde passa as noites? Se apenas conhecer um pouco da sua dura e induvidavel filosofia de vida? Aquela filosofia que parece tao complicada, mas tao facil de aceitar?
E se essa pessoa tiver as respostas para tudo? Qualquer duvida que tenha, se conseguir ter uma resposta logica e correcta? Se qualquer problema, afinal tiver soluçao obvia?
E se o raciocionio for melhor do que o meu e as minhas intençoes e os meus sentimentos, por muito puros que possam ser, foram ja descobertos? Entao e se tudo o que fizer estiver já justificado para si por me ter percebido para alem de mim proprio?

E se for uma daquelas pessoas que so eu admiro e orgulhosamente sigo na rua quando todos se voltam para nao a ver? Todos olham com olhares de desprezo, superioridade... para mim, eles sao aquilo que veem em nos. Eles sao os infelizes, os incapazes de ver com o coraçao aquilo que os olhos nao lhes mostram.
Em dias frios e ventosos como laminas que descrevem a face - com cabelos ao vento. Em dias de chuva fresca e pesada sempre surpreendente na cara, em redor dos olhos - com casacos compridos. Em dias de nevoeiro baço que nos toca como leves dedos de fumo - de olhos fechados em passos de uma certeza cicatrizada de antigas dores saradas. Em dias quentes que parecem nao ter fim, quando actividade parece um cirme e as paredes e chaos de antigas casas sao um refugio fresco para a alma - com roupas leves e largas, mas nem por isso um pouco menos negras.
Em solidao, de phones, impedindo ligar-se ao mundo e desligar-se do nosso. Em companhia, em ruas, em casa, em cafes, em bares... em silencio ou discutindo filosofias mortas e esquecidas.
Em autocarros, escondidos no fundo. Em ruas, escondidos nas sombras da noite. Um entrelaçar de dedos escondidos do mundo, com medo que o mundo destrua alto tao pequeno e fragil. Apavorados que alguem o descubra. Afugentados pelo pavor 'a solidao duma multidao.

Se a ti apenas nada tiver para entregar?
E se tiver o imenso nada para ti?
E se ao chegares a casa, na tua cama coberta com veludo negro, 'a luz das duas velas 'a cabeceira, tiveres essa rosa? Será que me deves um beijo?
Talez nao, pois tudo isso era já teu. Desde o frio morto do vacuo no universo desconhecido até ao calor no nucleo da terra... nada te posso dar que ja nao conhecesses e tivesses tido.
Ainda assim, te sentes lisonjeada pelo facto de tanto como apenas o nada te querer dar..."


Este post deveria ser acompanhado de uma fotografia, mas nao consegui dar entrada dela. Logo que resolva este pequeno problema de softeare, estará aqui. Um texto e imagem (ainda por vir) da autoria de Fernando Vargas, postado (quase) com o seu consentimento.

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